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quinta-feira, 25 de maio de 2023

É primavera, quase verão

 

Já economizou água e fez sua hortinha?

Semana passada, minha sobrinha-neta mais velha Luisa estava em casa e eu, toda entusiasmada, a convidei para a gente ver o pôr-do-sol na praia. Eram 6 horas da tarde e ela respondeu calmamente: “Tia Lena, só se a gente for as 9 horas da noite...”

Pois é. Leva-se um tempo para se acostumar com o horário de primavera-verão em que o sol desaparece cada dia mais tarde. Já tinha vivenciado essa sensação em uma viagem a trabalho para a Suécia, mas é completamente diferente quando você reside no velho continente. Pode até ser impressão de moradora ‘de primeira viagem’, mas o sol parece cada dia mais quente e as plantas – assim como os humanos e animais - reclamam por mais água. 

Nesse ano, devido à atual seca, consumir água exige mais cuidado dos governos e dos cidadãos. Uma das notícias de ontem (25/05) é que Portugal não ‘autoriza mais culturas permanentes de olival, abacate e frutos vermelhos’ em Alentejo e em Algarve, segundo matéria do jornalista Carlos Dias no jornal Público.  A medida tomada pelo Ministério de Agricultura e Alimentação irá vigorar enquanto se mantiver o ciclo de seca severa e extrema, ainda que a ministra tenha destacado o papel dessas culturas na ‘balança de pagamentos’. Ao mesmo tempo, haverá incentivo para culturas menos consumidoras de água. A EDIA, empresa de desenvolvimento e infraestruturas do Alqueva, lançou o programa Alqueva Sustentável para “responder aos desafios enfrentados pelos agricultores da região”. 


Alqueva é um projeto conceituado para fins múltiplos situado no Alentejo, sul do país, segundo site da EDIA. Não diz muito, mas ali está a barragem de Alqueva, construída no rio Guadiana, e que lidera um sistema integrado por 69 barragens e reservatórios. A represa de Alqueva, segundo site, é a maior reserva estratégica de água da Europa com capacidade total de 4150 milhões de metros cúbicos. As infraestruturas ali presentes permitem irrigar uma área de 130 mil hectares. E aqui vale uma lição aprendida nesses meses: não se compara nem áreas nem países - como Brasil e Portugal - algo muito feito por nós que aqui estão como emigrantes. Cada país tem seus encantos, problemas e soluções. Afinal, só a soja no Brasil, segundo informação da Datagro, o total semeado foi revisto para 44,22 milhões de hectares, o que representa alta de 4,9% versus a safra 2021/2022.

Números, discursos e intenções à parte, é importante destacar a preocupação governamental com a agricultura assim como de organismos, empresas e iniciativas - tudo criado para apoiar os agricultores. Afinal, a agricultura contribuiu e muito para o crescimento do país que atingiu 6,7% em 2022, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística de Portugal.

Deixando os números de lado, vale dizer que nessa estação mais quente, as pessoas se animam a ter mais vasos de flores em casa, a renovar seus vasos de plantas ou a iniciar pequenas hortas. E há algo facilmente notado quando se caminha diariamente no bairro: as pessoas aproveitam cantinhos em suas casas para cultivar folhagens, tomates, e ainda pequenas árvores de limão amarelo ou vasos de flores. 

Então, animada pelo clima primaveril, fui comprar terra, vasos e sementes na Flor do Norte, mega loja presente há 35 anos no bairro Arcozelo (onde mora minha sobrinha e família). Lição aprendida na primeira compra: aqui lojas de plantas vendem plantas. Então, se precisar de pazinhas, pequenos rastelos e outros utensílios necessários, melhor procurar nas grandes lojas da China (onde se encontra de tudo um pouco com preços convidativos para comprar) ou em grandes supermercados (onde, nessa época, vendem esses artigos).


Com a varanda organizada – terra, floreiras, sementes, ferramentas - pedi ajuda via WhatsApp para Dora e Carlinhos, amigos de longa data e que têm a Mandrágora Arte Ornamental no Embú das Artes. São experts e já me orientavam no Brasil com outros tipos de plantas.  Então, Descubro, então, para minha surpresa, que é preciso fazer buraquinhos distantes três centímetros na floreira para plantio de salsinha. 

Sabiam que o alecrim é um antissocial – gosta de pouca água e não se dá com a pequenina salsinha. Tudo plantado na primeira floreira, penso que é preciso apenas esperar alguns dias para elas germinarem e crescerem – assim como as plantas do meu vizinho debaixo que tem um belo espaço por morar no rés-de-chão – como chamam o andar térreo - e colhe couves e outras folhas simplesmente enormes.  

Aí aprendo outra lição, dada pela sobrinha Paola que mora em Milão há mais de 15 anos: dificilmente, as salsinhas de sementes plantadas nas floreiras terão o mesmo tamanho daquelas em vasinhos que a gente compra nos supermercados. Não desisto, mas, por via das dúvidas, vou de novo para a Flor do Norte e compro tomates e manjericão-de-folha larga, como é conhecido o manjericão, já plantados, e transfiro para uma segunda floreira.  Afinal, as pequeninas salsinhas podem se entusiasmar com a presença dos tomateiros e ganharem envergadura!


De volta à escassez de água nesses tempos mais secos, percebe-se a consciência dos cidadãos no uso da água. As pessoas não lavam calçadas – um hábito que no Brasil eu já considerava desperdício.  Carros? Levam em serviços que fornecem água e aspirador e onde elas mesmas limpam seus veículos.  Como esse é um hábito que não tenciono adquirir, descobri um lava jato automático perto de casa bem mais barato que os lava jatos dos shoppings. E aí ganho mais uma  lição: Por que pagar mais um euro pela cera, se o trabalho de encerar o carro será meu, logo após o carro receber um jato da dita cuja? A dica foi dada por um brasileiro que, ao perceber que eu tentava entender como a máquina funcionava, veio ao meu auxílio. Pedindo licença por se intrometer, me orientou a usar a máquina e ainda falou sobre o melhor custo-benefício de lavagem na tabela de preços. Cinco minutos depois, foi a minha vez de orientar um português que ali chegava para lavar seu carro, um belo Alfa Romeo.


Então, sempre é tempo de poupar água, de aprender o seu melhor uso e regar com cuidado as sementes plantadas para, com satisfação, pegar um pouco de manjericão para a salada do almoço ou do jantar – enquanto se aguarda o tomate tomar uma cor e ficar vermelhinho.

#Escassez de água #Alqueva #hortacaseira #lavarápido #alentejo 


quarta-feira, 10 de maio de 2023

Primeira etapa cumprida

Autorização de residência, a senha 
para sentir-se em casa

5 de maio às 11h30. Esse dia ficou em modo alerta na minha agenda desde dezembro do ano passado, quando recebi o passaporte com o visto concedido pelo governo português. Dia da entrevista no CNMAI - Centro Nacional de Apoio à Integração de Migrantes. Assim como eu, pelo menos duas centenas de pessoas ao longo daquela sexta-feira ensolarada na cidade do Porto dirigiram-se ao Edifício Capitolio. Na recepção, a funcionária pública localiza meu nome, dá a senha D-34 e orienta: "olhe no segundo quadradinho no ecrã (tela em Portugal). Agora, está no D24). 


Na sala, quatro fileiras de cadeiras ocupadas por pessoas de diferentes origens acomodando cerca de 30 pessoas. Muitas vindas das ex-colônias portuguesas na África e que integram a CPLP - Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. A CPLP, criada  há 27 anos em Lisboa, é constituída por Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Portugal, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste e visa uma cooperação político diplomática e defesa da língua portuguesa. 

Mulheres negras jovens, alguns rapazes com turbante - e todos olhando seus celulares. Enquanto uns trocam mensagens por whats, outros ligam e conversam em voz baixa em seus idiomas. Após 45 minutos, a senha H9 é chamada. Como não responde, a funcionária da recepção sai do prédio à  procura do dono da mesma. Sem êxito. Muitos aguardam do lado de fora e aproveitam para trocar informações, sempre úteis para quem está se adaptando a um novo lugar. Na sala de espera,  o ambiente é de silêncio - seguindo orientação da placa em uma das paredes. Ao observar pessoas de diferentes origens, fico refletindo sobre o quanto muitos de nós, brasileiros, desconhecemos nossa história, Durante os anos do primeiro e segundo grau, pouco se aprofunda sobre o conhecimento de nossas origens. E quando ingressamos na universidade, conforme as carreiras escolhidas, deixamos de lado o passado, vivemos o presente e projetamos constantemente o futuro. 

E é para ter um futuro melhor, com novas perspectivas de vida para si ou para a família, que muitos migram para países em que não dominam a cultura nem o idioma. Mesmo falando português, estamos em outra casa, com outros costumes e onde somos convidados. 



Após uma hora e meia, chega minha vez. Vou à sala das senhas D-H. Ali, há cerca de 20 mesas com cadeiras para receber os entrevistados. Ao lado de cada mesa, um scanner serve para que os documentos entregues sejam arquivados digitalmente e devolvidos em seguida. Sou atendida pela jovem funcionária Valéria.  Ela comenta que o sistema está um pouco lento: "Deve ser porque é sexta-feira". Conversamos sobre tendências de as empresas diminuírem ou eliminarem  esse dia de trabalho na semana e ela sorri: "Ah, seria muito bom se isso acontecesse!".  Após verificar tudo, fazer algumas perguntas e receber a ficha ali preenchida, fazer foto digital, a biometria e assinatura digital, Valéria explica que receberei pelo correio a autorização de residência. O pagamento da taxa é feito em outra mesa e dado o recibo.

Alívio. Estou mais tranquila. Eu e minha irmã, que me acompanhou para dar fundamental apoio, saímos. O sol continua forte em plena primavera. Agora é retornar para Canidelo, em Vila Nova de Gaia. Nos próximos passos dessa jornada, estão as providências para obter o número definitivo do SNS - Sistema Nacional de Saúde, e a carteira de condução portuguesa.   

Ao dirigir para casa, fico lembrando dos meses de preparação, dos muitos documentos providenciados, das  orientações da advogada da empresa contratada para orientar o processo, do envio pelo correio de tantos papeis em um envelope enorme e, claro, das várias taxas pagas até a chegada do passaporte com o visto e o agendamento da entrevista e sorrio para mim mesma. 

Agora sim, me sinto muito mais em casa. Então, é hora de conhecer melhor cada canto desse país que tem se destacado no cenário europeu ao receber migrantes e, especialmente, nesse último ano e meio, tem abrigado milhares de ucranianos. Mas essa é outra história que logo, logo, compartilharei. 

segunda-feira, 1 de maio de 2023

Nem tanto ao céu, nem tanto ao mar - o mundo dos supermercados

Para quem chega em Portugal, a variedade de supermercados encanta. Há lojas de supermercados franceses, alemães, espanhóis, além de duas redes portuguesas. A gama de produtos pode não ser tanta, mas os preços – especialmente de itens nas ofertas semanais – fazem a gente se sentir em um paraíso. Logo a gente aprende a consumir o que é da estação pois é mais barato. Agora, é época de frutos vermelhos e cítricos. Bananas chegam de Açores ou do Brasil, que também envia mamão formosa – um luxo que a gente aprende a comprar só metade e desfrutar no final de semana pois é bem caro. 

Carrinho lotado de frutas, verduras e de ofertas, com base na lista do que estava faltando em casa, é a hora do caixa. Além dos descontos semanais, há ainda os pontos dados pelo cartão do supermercado. Em um deles, é possível trocar esses pontos por euros em uma rede de combustíveis. 

No checkout, está Daniel Fernando Arfaarma, brasileiro e  residente em Vila Nova de Gaia há três anos. Começamos a colocar os produtos para serem pesados e precificados – em alguns supermercados isso é feito no momento do pagamento e, em outros, o cliente pesa fruta ou verdura na máquina no setor, tira a etiqueta e cola no saquinho. Então, ele abre um sorriso e diz: “que saudade desse sotaque!” 

E a conversa segue animada. Nascido e criado em Santos, fala sobre as mudanças da sua vida e conta como é trabalhar como caixa no Mercadona, uma rede espanhola que tem seus escritórios em Portugal localizados em Vila Nova de Gaia.  Explica os benefícios, o respeito dado aos funcionários e outras diferenças que observou em relação ao Brasil. Saudades? Claro que sente. Quando voltou para visitar a família e pensou em retornar à cidade natal, lembrou logo de sua vida aqui com mulher e filha e manteve a decisão. “Aqui, trabalhamos, mas também saímos para nos divertir, para passear e conhecer outros lugares. Aqui a gente vive, lá se sobrevive”. 



Em 2022, quem liderou o ranking dos supermercados foi o Continente, segundo estudo Kantar analisado em matéria de Ana Gaboleiro, a coordenadora editorial digital do site Imagens de Marca.  Mercadona ganha espaço entre os supermercados que mais vendem. Segundo a matéria, “o Lidl (supermercado alemão) é o grande vencedor de 2022". 

No outro lado da questão, há um processo da Autoridade da Concorrência (AdC) que, em 26 de abril, aplicou multas no valor total de 16,9 milhões de euros a Auchan, Modelo Continente, Pingo Doce e o fornecedor comum às três companhias, a JNTL Consumer Health, especializada em produtos de beleza, cosmética e higiene pessoal, alegando participação em esquema de fixação de preços. A questão está sendo examinada ainda pelo Tribunal Constitucional da União Europeia que vê traços de inconstitucionalidade nos trâmites do processo, ainda que a lei permita. 

Daniel termina o atendimento com um sorriso no rosto – algo que temos encontrado nos que prestam serviços de supermercados e de alimentação, nas áreas de ‘restauração’, como é chamado o setor de restaurantes nos centros comerciais, que para nós são os shopping centers. As diferenças no português luso e no brasileiro existem e, aos poucos, quem para cá vem morar, aprende palavras novas ou outros  significados – mas isso já é outra história.