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quinta-feira, 30 de março de 2023

Porto ou Lisboa? Rio ou Sampa?

 Mudar de continente requer a compra de itens iguais ao que se tinha e precisou se desfazer. Então, certo dia, lá vou eu mais uma vez para a Leroy Merlin de Canidelo, dessa vez acompanhada pelo sobrinho Octavio que está de férias e veio conhecer Portugal. Além da boa companhia, a vantagem é ele saber (e muito!) de eletrônica e de soluções para casa. Depois de entender como pegar senha e qual o atendente disponível (aqui tudo é com senha – até para comprar o pãozinho na padaria, mas isso é outra história...), somos atendidos por um gajo que de imediato observa não sermos daqui... Não, não é o sotaque brasileiro e sim o fato de estarmos sem agasalho nos dias finais de outono. Começamos a falar de Lisboa – onde Octavio estava – e o rapaz já iniciou os esclarecimentos sobre as duas cidades. Confesso que não imaginava encontrar do outro lado do oceano Atlântico rivalidade semelhante a que existe no Brasil – entre São Paulo e Rio de Janeiro; entre Belém e Manaus e por aí vai.

“Em Porto se trabalha. Lisboa é para tirar férias. Lá tudo é diferente”, esclarece o nativo português. “Se pedir um chopp, tem que dizer imperial. Aqui é fino”.   

E isso não é de hoje! Permita-me apresentar Ramalho Ortigão, autor do livro “As praias de Portugal”. Se estás a estranhar o nome, já te tranquilizo! Ele não é de nosso tempo.  José Duarte Ramalho Ortigão nasceu em 1836 no Porto. Formado em Direito por Coimbra, acabou por abraçar o jornalismo. Amigo de Eça de Queiroz, possuía verve espirituosa e era excelente observador. 

Conta nesse livro que, em certo momento, os portuenses – mesmo detestando touros – ao perceber que Lisboa tinha sua bela praça para a prática, construíram logo duas praças: “Vamos provar imediatamente que gostamos trezentas mil vezes mais de touros que eles!” , diziam. E foi assim que as touradas se tornaram atração durante dois anos, com roupas charmosas, guitarras importadas e tudo o mais.

Lisboa tinha recebido lição terrível, diz Ortigão. Porto havia mostrado que se quisesse gostar de touros, não haveria ninguém mais maníaco, mais doido e mais frenético que a gente dessa cidade. Lição provada, as praças foram abandonadas e os portuenses voltaram aos seus hábitos costumeiros – como o de apreciar o mar e o rio. E Ortigão termina o capítulo, pontuando:

“O portuense é o homem mais dedicado, mais serviçal, mais bom homem. Somente há três coisas de que ele não gosta. Não gosta de Lisboa. Não gosta da polícia. Não gosta da autoridade. Da autoridade, vinga-se, desprezando-a. Da polícia, vinga-se, resistindo-lhe. De Lisboa vinga-se, recebendo os lisboetas com a mais amável hospitalidade e com a mais obsequiosa bizarria”.

Então, será que sou Porto ou Lisboa? Rio ou Sampa? Manaus ou Belém? Não importa qual lado do oceano esteja, sigo apaixonada pelo modo descontraído e aberto de cidades banhadas por mares, sem deixar de gostar daquelas que se ergueram perto dos dos rios. Fino ou imperial? Importante é a companhia e a vista!  

Abaixo a praia que fez parte de minha caminhada  na última segunda-feira!   



quarta-feira, 22 de março de 2023

Pare, Olhe e... Sorria!

A tarde de 20 de março de 2023 estava quente no Porto, anunciando a chegada da primavera no hemisfério norte. Era o primeiro dia a caminhar sozinha nas ruas dessa cidade que tem encantado turistas. A rua Santa Catarina recebe de braços abertos alemães, japoneses, holandeses, argentinos, brasileiros, entre muitos outros que por ali circulam. Alguns caminham sorrindo e olhando um papel amarelado como se fosse um velho jornal. Então, com o calor, nada como um gostoso sorvete – ou um gelado como é chamado em Portugal. Andando devagar para saborear o sorvete de pistache, vejo duas jovens com chapéus coco. Enquanto uma tira fotos, a outra distribui os tais papeis amarelados. Diante da pergunta sobre o custo do trabalho, a resposta era sempre a mesma. Aquilo era uma doação e as pessoas colocavam ali o que podiam para as duas ucranianas.

Darya Yeremenko – a jovem que distribuía o papel amarelado A4 - está em Porto há pouco mais de um mês, já tendo passado por outras cidades de Portugal onde está há um ano, e por outros países europeus – depois de ter saído da Ucrânia onde ainda reside sua mãe.  Com olhos verdes e sorriso franco, explica que ainda fala pouco o português e entende melhor o inglês. Descontraída, enfatiza que Porto é uma cidade cativante, diferente de Lisboa e de outras por onde passou. Ali se sentiu como se estivesse em casa.

Enquanto Darya conversa comigo, Cristina Kopii cativa as pessoas, fotografando-as rapidamente.com uma câmera artesanal que lembra uma antiga Linhof 4x5 e que tem em seu bojo uma câmera digital. Logo em seguida, Darya retira o papel diagramado como uma antiga edição do Diário do Porto – e que traz a foto da pessoa fotografada abaixo do título “O Porto recebeu uma visita muito especial”. O texto padrão para todas as impressões conta sobre a cidade de Porto, a produção de seu famoso vinho e ainda informa alguns lugares que valem a pena ser visitados, como a Catedral da Sé ou a Torre dos Clérigos.




 A iniciativa faz parte do projeto Old Press, cuja comunidade no Instagram, denomina-se como o primeiro jornal de rua no mundo.  Pode até não ser, mas que as jovens ucranianas trazem charme para a rua Santa Catarina, ah, isso é verdade!

https://www.instagram.com/old.press/?hl=en